Esclarecimento:
não tenho a intenção de apresentar uma fórmula mágica da felicidade. Se
prometesse isso, o artigo seria mais atrativo, mas menos verdadeiro. O objetivo
é analisar o que faz alguns países serem considerados os mais felizes do
planeta.
Só que antes de ir além de nossas
fronteiras, uma olhada breve em nosso umbigo brasileiro.
Embora alguns analistas e
empresários tentem ver na bolsa de valores um indicador para o otimismo, a
realidade da grande maioria das pessoas passa longe dos números do mercado de
ações, capazes de fazer apenas poucos sorrirem. E o momento não é muito
animador.
Uma pesquisa feita pela
Crescimentum/Datafolha mostra que a autoestima do brasileiro está em baixa se
comparada com os mesmos dados de sete anos atrás. Nesse período, os aspectos
negativos citados por 2.422 entrevistados em todas as regiões do Brasil subiu
de 51% para 61%.
Os fatores apontados como os
principais responsáveis por derrubar o otimismo do brasileiro são: corrupção,
violência, pobreza, agressividade e poluição ambiental.
"Não há remédio que cure o que a felicidade não pode curar"
Gabriel García Márquez
Há cinco anos a ONU também
publica uma complexa lista (imagem abaixo) na qual tenta decifrar o nível de
felicidade em cada país. Nesse caso, o olhar genérico pode trair nossas
conclusões. O Brasil, por exemplo, aparece na vigésima segunda posição. Nada
mal se considerarmos que estamos a frente de vários países da Europa Ocidental e outros ricos asiáticos como o Japão.
No entanto, um mergulho nos
números ajuda a explicar algumas contradições que o gráfico traz. Primeiro, há
um peso considerável para o PIB per capita. Ainda que desigual, o Brasil
possui uma grande economia e isso puxa o país para cima. Por outro lado, temos
uma participação muito menor em “nossa felicidade” das métricas como “liberdade
para fazer escolhas pessoais”, “generosidade” e “percepção de corrupção”.
Há também outro componente que
parece empurrar o Brasil mais perto do topo. Um sentimento semelhante ao que
compartilham alguns países africanos, destacado pelo relatório como
“essencialmente otimista, em especial na juventude. Esse otimismo funciona como
uma profecia que se auto realizará nos próximos anos”. Sabe aquela história de
país do futuro? Então, ela é repetida ad aeternum enquanto aguardamos
ansiosamente por ele. Agora, lembremos, até o tradicional otimismo começa a
sofrer abalos no Brasil do século XXI.
Por isso entender alguns pontos
que fazem certos países liderar a lista pode nos ajudar a buscar nosso próprio
bem-estar. Ainda que a macroeconomia, a crise das instituições e outros
problemas persistam, é preciso ao menos ter um horizonte para seguir
caminhando. Uma edição da revista National Geographic destrinchou
três países que estão nas cabeças do ranking de felicidade: Dinamarca,
Cingapura e Costa Rica (a melhor colocada entre os latinos).
Uma das conclusões é a de que a
felicidade está imbricada com o governo e os valores culturais de cada nação.
Destaco alguns pontos levantados
para cada país que fazem a diferença e que, respeitando-se as particularidades
do Brasil, poderiam ser aplicados e, quem sabe, melhorar nossos indicadores
naquele tão esperado futuro.
Dinamarca: possui um dos mais elevados
impostos de renda do mundo (soa estranho quando ouvimos tantas vozes a dizer
que o problema do Brasil são os impostos). Em contrapartida às altas taxas, o
país escandinavo oferece saúde e educação gratuitas e ainda um serviço de apoio
financeiro, uma espécie de bolsa família para que qualquer pessoa possa contar
com uma renda mínima.
Outro ponto a se mencionar é o
senso de comunidade combinado com o equilíbrio entre a vida profissional e o
tempo para o lazer. Exemplo: lá os pais ganham um ano livre, bancados pelo
governo, para cuidar dos filhos recém-nascidos. A maioria da população trabalha
menos de 40 horas e possui cinco semanas de férias. De quebra, 90% dos
dinamarqueses fazem parte de um clube ou uma associação ligada a esportes ou
outras atividades culturais.
Cingapura: a nação asiática possui valores
típicos do continente: harmonia, respeito e trabalho duro. É verdade que alguns
habitantes reclamam dos altos preços e de muito trabalho. Mesmo assim, há uma
forte relação de confiança e segurança entre as pessoas. Eles também possuem um
programa que evita maiores diferenças salariais. Qualquer um que se esforce em
qualquer trabalho, até a mais humilde das ocupações, tem garantido um salário
para uma vida digna, com subsídios em moradia e saúde.
Costa Rica: O pequeno país da América Central
é talvez aquele que culturalmente mais se aproxima do Brasil e, por isso, é
importante entender um pouco mais da receita da felicidade dos costa-riquenhos.
Ao contrário do Brasil e outros latinos, sua geografia e seu tamanho não
permitiram a formação de latifúndios ao longo de sua história e a extrema
concentração de renda. Tudo é produzido em pequenas propriedades e produtores
independentes.
O país elegeu professores como
presidentes com carta branca para apostar no bem-estar social e forte amparo ao
meio-ambiente. Nos anos 30, analfabetos foram praticamente erradicados, o
fornecimento de água limpa para fazendeiros ajudou a eliminar doenças como cólera
e diarréia (anote: saúde é um essencial componente da felicidade). Aliás, além
de contar com um sistema de saúde universal, desde os anos 90 há um programa no
qual uma equipe formada por médicos, enfermeiras e outros técnicos que cuidam
de até 3.500 pessoas.
Mais: a Costa Rica não possui um
exército desde os anos 40 quando decidiu investir o dinheiro que iria para
armamentos e defesa em meio ambiente e segurança social. Em Costa Rica, a
população não dispõe de tantos luxos, mas não há outro lugar no mundo que
entregue mais felicidade por cada dólar do PIB.
Publicado em: 30 de outubro de 2017
Autor: Rodrigo Focaccio
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